Maio, o mês de Maria

Por Francisco Fernández-Carvajal

Precisamos recorrer à Virgem sempre, mas especialmente no mês de Maio, mês desde há muitos séculos dedicado especialmente a Mãe de Deus.


 

I. A DEVOÇÃO À VIRGEM ATRAI A MISERICÓRDIA DIVINA.

“Mês de sol e de flores […], mês de Maria, coroando o tempo pascal. O nosso pensamento vinha seguindo Jesus desde o Advento; agora que a paz, que é conseqüência da Ressurreição, reina no nosso coração, como não nos dirigirmos Àquela que no-lo trouxe?

“Apareceu sobre a terra para preparar a sua vinda; viveu à sua sombra, ao ponto de não a vermos no Evangelho senão como Mãe de Jesus, seguindo-o, velando por Ele; e quando Jesus nos deixa, Ela desaparece suavemente. Desaparece, mas fica na memória dos povos, porque lhe devemos Jesus…”. (1)

Como em outras ocasiões, Jesus dirige-se à multidão e fala-lhe dos mistérios do Reino de Deus. As pessoas que o rodeiam têm os olhos fixos nEle e guardam um profundo silêncio. De repente, uma mulher grita com toda a força: Bem-aventurado o ventre que te trouxe e os peitos que te amamentaram. (2)

Começa a cumprir-se a profecia contida no Magnificat: Eis que todas as gerações me proclamarão bem-aventurada. (3) Com o desembaraço da gente do povo, uma mulher dá início àquilo que não terminará até o fim do mundo. Essas palavras de Santa Maria, proferidas nos começos da sua vocação sob o impulso do Espírito Santo, teriam o seu total cumprimento através dos séculos: poetas, intelectuais, reis e guerreiros, artesãos, mães de família, homens e mulheres, gente de idade madura e meninos que acabaram de aprender a falar; no campo, na cidade, no cume dos montes, nas fábricas e nos caminhos; no meio da dor ou da alegria, em momentos transcendentais (quantos milhões de cristãos não entregaram a sua alma a Deus olhando para uma imagem da Virgem ou recitando com os lábios ou apenas em pensamento o doce nome de Maria!), ou simplesmente no dobrar de uma esquina da qual se vislumbrava uma imagem de Nossa Senhora; em tantas e tão diversas situações, milhares de vozes, em línguas diversíssimas, cantaram os seus louvores à Mãe de Deus.

É um clamor ininterrupto por toda a terra, que atrai todos os dias a misericórdia de Deus sobre o mundo, e que não se explica senão por um expresso querer divino. “Desde remotíssimos tempos – recorda o Concílio Vaticano II – a Bem-aventurada Virgem Maria é venerada sob o título de Mãe de Deus, sob cuja proteção os fiéis se refugiam súplices em todos os seus perigos e necessidades.” (4)

Todo o povo cristão soube sempre chegar a Deus através da sua Mãe. Com uma experiência constante das suas graças e favores, chamou-a Onipotência suplicante e encontrou nEla o atalho que o levava mais depressa para Deus. O amor inventou numerosas formas de tratá-la e honrá-la e a Igreja fomentou e abençoou constantemente essas devoções como caminho seguro para chegar até o Senhor, “porque Maria é sempre caminho que conduz a Cristo. Todo o encontro com Ela não pode deixar de terminar num encontro com o próprio Cristo. E o que significa o contínuo recurso a Maria senão procurar entre os seus braços, nEla, por Ela e com Ela, a Cristo, Nosso Salvador?” (5)

 

II. O MÊS DE MAIO

Neste mês de maio, muitos bons cristãos cultivam especiais manifestações de piedade para com a Virgem Santa Maria, e essas práticas são para eles fonte de alegria em todos os dias do mês. Seguem de perto a recomendação do Concílio Vaticano II: “Todos os fiéis cristãos ofereçam insistentes súplicas à Mãe de Deus e Mãe dos homens para que Ela, que com as suas preces assistiu às primícias da Igreja, também agora, exaltada no Céu sobre todos os bem-aventurados e anjos, na Comunhão de todos os Santos, interceda junto do seu Filho”. (6) E em outro lugar: “Dêem grande valor às práticas e aos exercícios de piedade para com a Virgem Maria recomendados pelo Magistério no decurso dos séculos”. (7)

A devoção à Virgem no mês de Maio nasceu do amor, que sempre procurou novas formas de exprimir-se, e da reação contra os costumes pagãos que existiam em muitos lugares no “mês das flores”. Ao longo dos dias deste mês, os cristãos oferecem a Nossa Senhora especiais obséquios que os levam a estar mais perto dEla: romarias, visitas a alguma igreja a Ela dedicada, pequenos sacrifícios em sua honra, horas de estudo ou de trabalho bem acabado, mais atenção na recitação do terço… “Surge assim em nós, de forma espontânea e natural, o desejo de procurar a intimidade com a Mãe de Deus, que é também Mãe nossa; de conviver com Ela como se convive com uma pessoa viva, já que sobre Ela não triunfou a morte, antes está em corpo e alma junto de Deus Pai, junto de seu Filho, junto do Espírito Santo […].

“Como se comporta um filho ou uma filha normal com a sua mãe? De mil maneiras, mas sempre com carinho e confiança. Com um carinho que em cada caso fluirá por condutos nascidos da própria vida, e que nunca são uma coisa fria, mas costumes íntimos de lar, pequenos detalhes diários que o filho precisa ter com sua mãe e de que a mãe sente falta se alguma vez o filho os esquece: um beijo ou uma carícia ao sair de casa ou ao voltar, uma pequena delicadeza, umas palavras expressivas…

“Em nossas relações com a nossa Mãe do Céu, existem também essas normas de piedade filial que são os moldes do nosso comportamento habitual com Ela. Muitos cristãos adotam o antigo costume do escapulário; ou adquirem o hábito de saudar – não são precisas palavras, basta o pensamento – as imagens de Maria que se encontram em todo o lar cristão ou adornam as ruas de tantas cidades; ou vivem essa maravilhosa oração que é o terço, em que a alma não se cansa de dizer sempre as mesmas coisas, como não se cansam os namorados, e em que se aprende a reviver os momentos centrais da vida do Senhor; ou então acostumam-se a dedicar à Senhora um dia da semana – precisamente este em que agora estamos reunidos: o sábado –, oferecendo-lhe alguma pequena delicadeza e meditando mais especialmente na sua maternidade”. (8)

 

III. AS ROMARIAS: SENTIDO PENITENCIAL E APOSTÓLICO.

Uma manifestação tradicional de amor à nossa Mãe é a romaria a um santuário ou ermida de Nossa Senhora. É uma visita revestida de caráter penitencial – traduzido talvez num pequeno sacrifício: fazer o trajeto a pé a partir de um lugar conveniente, ter algum pormenor de sobriedade que custe sacrifício… – e de sentido apostólico, com o propósito de aproximar mais de Deus as pessoas que nos acompanham e rezando juntos com especial piedade os três terços do Santo Rosário.

A romaria pode ser uma ocasião muito propícia e fecunda de apostolado com os nossos amigos. Nesses santuários e ermidas, milhares de pessoas alcançaram graças ordinárias e extraordinárias da Mãe de Deus: uns começaram uma vida nova, depois de fazerem uma boa confissão dos seus pecados, talvez após muitos anos; outros compreenderam que o Senhor os chamava a uma entrega mais plena ao serviço dEle e das almas; outros obtiveram ajuda para vencer graves dificuldades da alma ou do corpo… Ninguém voltou desses lugares com as mãos vazias. Paulo VI dizia que a Providência, “por caminhos freqüentemente admiráveis, marcou os santuários marianos com um cunho particular”. (9)

As pessoas acorrem a estes lugares, pequenos ou grandes, em que há uma presença especial da Virgem, para dar-lhe graças, para louvá-la, para pedir-lhe, e também para começar uma vida nova depois de terem vivido talvez longe de Deus. Porque, como diz João Paulo II, a herança de fé mariana de tantas gerações não é nesses lugares marianos mera recordação de um passado, mas ponto de partida para Deus. “As orações e sacrifícios oferecidos, o palpitar vital de um povo, que manifesta diante de Maria os seus seculares gozos, tristezas e esperanças, são pedras novas que elevam a dimensão sagrada de uma fé mariana. Porque, nessa continuidade religiosa, a virtude gera nova virtude, a graça atrai graça”. (10)

Estes locais de peregrinação, que remontam aos primeiros séculos, são atualmente incontáveis e estão espalhados por toda a terra. Foram fruto da piedade e do amor dos cristãos à sua Mãe através dos séculos. Preparemos nós a romaria na nossa oração, com sentido apostólico, com sentido penitencial (que facilita a oração e a eleva com maior prontidão a Deus) e com uma grande devoção mariana, que se há de manifestar nesse dia pela recitação cheia de piedade do Santo Rosário. Não esqueçamos que assim estaremos cumprindo a profecia feita um dia por Nossa Senhora: Eis que todas as gerações me proclamarão bem-aventurada. Não nos esqueçamos também de ter, durante todos os dias deste mês, especiais demonstrações de amor para com a nossa Mãe.

 

NOTAS

(1) J. Leclercq, Siguiendo el año litúrgico, Rialp, Madrid, 1957, págs. 215-216;

(2) Lc 11, 27;

(3) Lc 1, 48;

(4) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 66;

(5) Paulo VI, Enc. Mense Maio, 29-IV-1965;

(6) Conc. Vat. II, Const. Lumen gentium, 69;

(7) ib., 67;

(8) Josemaría Escrivá, É Cristo que passa, n. 142;

(9) Paulo VI, Carta aos reitores dos santuários marianos, 1-V-1971;

(10) João Paulo II, Homilia em Saragoça, 6-XI-1982.

 

Fonte: Falar com Deus, vol. II, Quadrante, 2005

Tradução: Ricardo Pimentel Cintra